Cacau: um novo artigo de luxo da agricultura?

por | jan 29, 2025

Brasil vive grande oportunidade, mesmo com expectativa de safra menor em 2025

Em 2023, a tonelada do cacau atingiu um recorde de aproximadamente R$ 75 mil (ou US$ 12.605). No entanto, nem todos os produtores brasileiros conseguiram aproveitar essa alta histórica. A razão? Problemas estruturais e produtivos que há tempos afetam a cultura cacaueira global.

A oferta mundial enfrenta uma forte limitação, resultado de desafios climáticos, envelhecimento das lavouras e incidência de pragas e doenças, principalmente nos principais produtores globais: Gana e Costa do Marfim. Como reflexo desse desequilíbrio entre oferta e demanda, os preços do cacau dispararam na Bolsa de Nova York, acumulando uma valorização de 165% em 2024, segundo a StoneX. Desde a safra 2021/22, o déficit global já soma 758 mil toneladas, colocando o mercado em alerta.

O Brasil e o desafio da autossuficiência

Embora seja um dos grandes consumidores de chocolate do mundo, o Brasil ainda é deficitário na produção de cacau desde a crise da vassoura-de-bruxa. “O Brasil produz menos do que consome e, por isso, é importador de cacau há anos. Trabalhamos para mudar esse cenário e alcançar a autossuficiência”, afirma Anna Paula Losi, presidente executiva da Associação Nacional das Indústrias Processadoras de Cacau (AIPC).

E reafirmando a perspectiva global de escassez, a safra brasileira de 2024 foi abaixo do esperado. Em 2023, o país produziu 220 mil toneladas, mas no último ano o volume caiu para cerca de 180 mil toneladas – uma retração de 18,5%. A expectativa para 2025 continua desafiadora, já que a reposição dos estoques globais parece improvável. “Mesmo que a safra africana seja boa, ainda teremos déficit. Isso manterá os preços pressionados”, explica Anna Paula.

Oportunidades para o Brasil

O cenário global de baixa oferta pode representar uma oportunidade para o Brasil consolidar sua produção e, eventualmente, voltar a ser exportador. “O Brasil tem todos os elos da cadeia: produção, indústria moageira, indústria chocolateira e um forte mercado consumidor”, destaca a presidente da AIPC. O país é atualmente o quinto ou sexto maior consumidor de chocolate do mundo.

O aumento da produtividade é um fator crucial para esse avanço. “Hoje, a produtividade média no Brasil é de 300 a 350 kg por hectare, muito baixa. Se conseguirmos dobrá-la para 600 ou 700 kg/ha, a produção nacional pode atingir 400 mil toneladas, tornando-se autossuficiente e até exportadora”, projeta Anna Paula.

Além disso, a cacauicultura está se expandindo para novas áreas. Regiões como o Oeste da Bahia, São Paulo, Mato Grosso e Tocantins têm atraído investimentos empresariais, trazendo inovação e tecnologia para o setor. Nessas novas fronteiras agrícolas, as produtividades podem alcançar até 3.000 kg/ha, muito acima da média atual.

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Principais desafios: assistência técnica e mecanização

Para que essa revolução produtiva aconteça, desafios estruturais precisam ser superados. “A assistência técnica é a base de tudo. Sem ela, o produtor não tem acesso ao conhecimento necessário para melhorar a produtividade”, ressalta Anna Paula. Muitos produtores, mesmo diante dos preços recordes, não conseguiram aproveitar a alta porque simplesmente não tinham cacau suficiente para vender.

Outro gargalo crítico é a disponibilização de mudas de qualidade em quantidade suficiente para renovar e expandir as lavouras. Paralelamente, a mecanização da cacauicultura também é um desafio. “A produção ainda é muito manual, especialmente na Bahia, onde a cabruca dificulta a mecanização convencional. Precisamos desenvolver equipamentos adaptados às condições locais”, explica.

Muitos eventos na cadeia, têm debatido a mecanização. No Brasil, algumas iniciativas patrocinadas por instituições do setor têm buscado soluções para tornar a colheita e o beneficiamento mais eficientes. Um exemplo recente foi o desenvolvimento de uma máquina de quebra de cacau acessível para pequenos produtores, reduzindo custos e aumentando a produtividade.

Protótipo do ‘quebra-cacau’ — Foto: Felipe Silva/Arquivo pessoal

Expectativas para 2025

Se as condições climáticas forem favoráveis, a expectativa é de uma melhora na produção brasileira em 2025, podendo superar novamente a marca de 200 mil toneladas. Com investimentos em tecnologia, assistência técnica e novos modelos produtivos, o Brasil tem potencial para mudar seu status no mercado global de cacau.

A crise mundial pode ser um catalisador para essa transformação. Com planejamento e incentivos adequados, o país tem a chance de fortalecer sua cadeia produtiva e consolidar-se como um grande player na cacauicultura mundial.